Zeca Afonso - Vampiros
No céu cinzento
Sob o astro mudo
Batendo as asas
Pela noite calada
Vêm em bandos
Com pés veludo
Chupar o sangue
Fresco da manada
Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhes franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
A toda a parte
Chegam os vampiros
Poisam nos prédios
Poisam nas calçadas
Trazem no ventre
Despojos antigos
Mas nada os prende
Às vidas acabadas
São os mordomos
Do universo todo
Senhores à força
Mandadores sem lei
Enchem as tulhas
Bebem vinho novo
Dançam a ronda
No pinhal do rei
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
No chão do medo
Tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos
Na noite abafada
Jazem nos fossos
Vítimas dum credo
E não se esgota
O sangue da manada
Se alguém se engana
Com seu ar sisudo
E lhe franqueia
As portas à chegada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
Eles comem tudo
Eles comem tudo
Eles comem tudo
E não deixam nada
Zeca Afonso (Poeta e cantor português, 1929-1987)
Imagem: Nosferatu by al dark side
2 comentários:
Susana,
Politica, porquê?
Manuel,
compreendo a sua questão, porque neste tema mudei um pouco o âmbito das palavras que me tocam... De palavras intimistas, de emoções idividuais, passei para palavras que espelham emoções colectivas e nada intimistas. No entanto, ambos os tipos de poemas têm um ponto comum: a densidade das emoções e da mensagem que querem transmitir. É, provavelmente, por isso que todos eles me tocam.
Neste tema resolvi falar de política porque também as palavras da política me tocam. Também as palavras políticas me suscitam emoções. Não sou militante de nenhum partido, mas existem determinadas questões (políticas e sociais) a que sou sensível. Nos poemas que escolhi estão retratadas algumas dessas questões.
Um abraço,
Susana Barrisco
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