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segunda-feira, fevereiro 04, 2008

Jorge Antunes - Fado/Saudade



Foto: Fado, JoanLovesPaper


Diz-se por ai
Diz quem sabe
Que o fado nasceu da saudade
Saudade que nasceu aqui

Neste lugar
Neste mar
Neste pequeno país

Diz quem sabe
Que não cabe
A um poeta ser feliz

E deste povo poeta
Desta alma sempre incerta
Do seu imenso sentir

Da pena fez-se profeta
Em verso escreveu modesta
A lágrima de ver partir

Fez dos sonhos uma canção
Fado, fado, ilusão
Para sempre eternidade

Diz quem sabe, que da razão
Não vive quem tem coração
Quem o tem, vive a saudade





jorge@ntunes (Poeta português, publica no poetik4ever)

domingo, maio 13, 2007

Lavínia Saad - Estar só



Estar só já não me espanta—
A solidão hoje me é
Contígua.
(Um vaso e a sua sombra).

Companheira espelhada das horas magras,
Sempre muda, reflexiva.
Ouso dizer? Meio
Amiga.

O que temo, justamente, é:
Me acostumar de vez
Com essa tímida
Rapariga.



NY, abril de 2007

Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, Autora do Palavrogramas, 1975- )

Lavínia Saad - Sou quase eu



Sou quase eu.
Um dia eu ainda
Me preencho. Ah
E como seria apaixonante
Ir um bocadinho além da conta.



Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, autora do Palavrogramas, 1975- )

domingo, abril 15, 2007

As minhas palavras... 15 de Abril de 2007



Caros amigos,

hoje apresento-vos uma poetisa que conheci através de um poema que ela me enviou.
Gostei tanto que segui o seu rasto na blogoesfera e encontrei um mundo denso de sentimentos.

Amei.

Como já devem de ter percebido, gosto de textos aparentemente simples. Gosto de textos simples nas palavras, mas densos nos sentimentos. E, na minha perspectiva, é isso que leio na poesia de Lavínia Saad.

Lavínia Saad é um pseudónimo. Lavínia disse-me "só na anonimidade eu consigo escrever desinibida" e apresentou-me Lavínia da seguinte forma:

“Lavínia Saad (nascida em 1975) é poeta e tradutora brasileira. Ela escreve há quinze anos, sempre guardando os poemas num baú ao pé da cama. Em 2006 o baú estourou e ela começou a publicar os poemas na internet: http://www.palavrogramas.blogspot.com "

Claro que podem e devem visitar o blog da Lavínia, mas entretanto conheçam um pouco do que escreve através de:

- Alguém me perguntou porque escrevo
- Uma visita sua (II)
- Roleta de vidro
- Das lides
- Hiato
- Povoam-te
- A mesa
- Vistoria
- Coração de Lava
- Vitrine
- Perder
- Sermão

Espero que gostem.

Um abraço e muito obrigada por regressarem.

Susana B.


Lavínia Saad - Alguém me perguntou por que escrevo



Foto: Ana Rita Rodrigues



Remexe-se aquele feixe de nervos saltado
uma dor pequenina e gostosa
empurrar
com a língua o dente de leite solto
sentir
o gosto metálico da gengiva em flor viva
desenterrar

outra coisa que desponta na carne




Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Uma visita sua (II)



Foto: Nicola Ranaldi



Uma visita sua
é um copo de água fresca,
é a água e o copo
e a mão que segura o copo.
Em dias que eu não tiver mais copo
faz as mãos em concha
que te darei água fresca.
Em dias que eu não tiver mais água
faz as mãos em flor
eu saberei conjurar a água.
Uma visita sua
é em si um copo de água fresca.

A tua ausência
é um leito seco de riacho.
Barro duro e rachado,
ossos encrustados no chão.
É as margens ásperas dos meus lábios,
os sulcos vazios, palavras num vão.
Eu rôo a tua ausência
até sobrar só um pitoco.
Eu descasco a tua ausência
Até restar só o caroço.
Faz falta a sua visita
como um rio de água fresca.



Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Roleta de vidro



Foto: Roleta Russa, de Baroniti




Se você disser pra pular,
Eu pulo.
Nós fomos sempre assim,
Os dedos dos pés agarrando a quina da tábua.
Prontos pra rasgar a membrana d'água.
Profundezas soturnas ondulando sob o píer, ou talvez:
Pedregulhos afiados querendo nuca, prometendo
Altas paralisias.
Eu ouço ainda os teus desafios incautos,
Aquele teu faiscante meio-desejo
De nos matar.
O meu tórax incandescente
Latejando, impregnado,
Meio-querendo não te amar.
Arriscando tanto por tão pouco.
Ainda hoje somos assim.
Esta líquida geografia, quanta
Fútil precaução.
Mesmo desde aí,
Se você disser pra pular,
Pior que eu ainda pulo.

No fundo e no final de cada dia
Eu quero apenas
Me enroscar na serpente
Martelar um pífio verso.



Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Das Lides



Foto: Envolve-me, de Margarida Araujo



Dizem do touro quando enfia as hastes
Pelo fato do toureiro:
Enganchou.
Dizem do toureiro quando mete a lâmina
Pelo couro do touro:
Deu o golpe de misericórdia.
E quando eu atravessar a sua gravata e o seu peito,
E quando você me perfurar a saia e o ventre,
Dirão o quê desta nossa festa?
Os eufemismos de madrepérola
Não nos bastam. Nesta corrida
Já não se gastam sequer
Bandarilhas, nem essa tal
Misericórdia.



NY, Março de 2007

Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Hiato



No meio da semana você abre um parêntese,
Derrama tudo quanto te preenche, aí
Fecha o parêntese
E volta pro escritório.



NY, Abril de 2007

Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Povoam-te



Povoam-te,
Miúdas e caladas,
As roedoras dúvidas.
Trouxinhas de pólvora
Num crânio trepanado.
Os teus dedos formigando,
Antecipando a nódoa branca
Que de um estalo
Devora o breu.



NY, Abril de 2007

Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - A mesa



Entre duas conversas desencontradas
Ele dobra o guardanapo sobre a mesa,
Declara:
Sou um deserto de emoções.
Ninguém ouve. As conversas desencontradas
Prosseguem. Risos e vinhos se sobrepondo,
Uma noite indiscutívelmente engraçada.

Ele encaixa a voz no espaço entre as palavras
(Que só ele entende ser silêncio),
Se diz que está vazio.
Como se devesse sentir-se pleno,
Recheado feito um profiterole,
Cheio como a lua cheia,
A pança redonda do vizinho sebento.

Alguém pausa, reparando na sua
Ausência presente, na sua
Presência ausente.

Ela pausa no meio da risada,
Encaixa a mente no vazio
Que precede os diálogos:
Sou uma ilha de emoções.
Tudo o que tenho
Mal cabe dentro de mim, e ao meu redor,
Há só o vasto e arisco mar.

Lacrado sob vácuo,
Ele não percebe. Aos poucos
Ele vai evaporar na areia.
Aos poucos
Ela vai se afogar na água.

As taças já secas e enfileiradas na estantes,
As gargantas já lavadas do riso,
Daquela conversa jamais-tida
Sobra apenas
Uma pequenina vertigem,
Coisa pra poema.



Rio de Janeiro, Março de 2007

Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Vistoria



Foto: Memórias da pele, de Elsa Mota Gomes



Apalpas brechas. Eu
remendo armaduras.
Prosseguimos com
nossos delicados
jogos de guerra.
A dor, já esgotada,
serve de alimento—
come, amor.



Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Coração de lava



Foto: Explode, de Ugly



Um coração de lava:
Aqui brotam farpas,
Disparam labaredas.

Fumegantes correntezas
Serpenteiam,
Lentas e letais,

Por minhas entranhas--
Borbulhantes,
Sulfurosas.

Mas nesta boca
Forrada de cinzas,
De dentes cerrados,

Uma língua sonolenta
Trava a garganta:
Pedregulho-represa.

De entre meus lábios
Despencam frias
Cascatas de mármore

Lapidado.



Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Vitrine



Foto: Elena Vasileva



Você vem à minha casa—
Eu cozinho macarrão—
Você me retorce as vísceras—

Eu tenho a boca afiada, é
e os olhos moles, sou puro mel
e cal viva. Abre a boca e engole.

Cheiro a tua frieza pétrea—
Chega mais: você já viu de perto
um coração remendado—
um bule vermelho e roliço
estilhaçado e recomposto?

Superbonder é demais.
Vá pro inferno.
Eu tenho fome e vou jantar sozinha.



Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Perder



Saber
despertencer.
Nos aferramos a este mundo
como moluscos ao casco da barca.
Aprender o perder--
quando e como soltar--
deixar estar.



Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

Lavínia Saad - Sermão



Eu, que me deleitava com migalhas,
Hoje cobiço a padaria.



Rio de Janeiro, Março de 2007

Lavínia Saad (Poetisa e tradutora brasileira, 1975- )

domingo, abril 08, 2007

Palavras Recebidas # 3



Quando iniciei este blog, um dos meus desejos, era que, os seus visitantes participassem na sua construção. Pedi comentários e palavras vossas, ou palavras que vocês amem. Pretendia e pretendo que os poemas que publico gerem sentimentos, conversas, discussões e novas palavras. Foi isso que aconteceu com o Bolero do coronel sensível que fez amor em Monsanto, de António Lobo Antunes. Depois do poema do Zenite, esta semana recebi um poema do Tó Zé. Muito obrigada aos dois por participarem neste blog.


Foto: Saint (as saint...?) by Zew1920



Nem santo nem lobo
eu que me comovo
por tudo e por nada
vi uma catraia
perdida na rua
só abandonada
vestida ia nua
já mulher-da-vida
não ouvi seus ais
ignorei sua dor
também o seu cheiro
não sei se tem pais
se é filha querida
se precisa de amor
ou apenas dinheiro
segui minha vida
de tudo alheado
ignorei seu fado
não mais a lembrei
até certo dia
ao ler um poema
ao som do Bolero
eu que me comovo
por tudo e por nada
pergunto a mim mesmo
se é isto que quero
eu que me comovo
ignoro o meu povo
nem santo nem lobo


Foto: Aleksander Bochenek



Tó Zé Rodrigues


Palavras Recebidas # 4



Renato Macedo - Estrela Polar



Lá no céu há uma estrela que nos guia
Pela estrada da vida docemente,
Afagando o caminho quando a gente
Pousa os pés ao trilhar de cada dia.

Cá na terra há uma sombra fugidia
Que nos seduz, seguindo à nossa frente,
Nos persegue à esteira do poente
E se alonga ante o sol em agonia.

Quando a noite dolente vem caindo,
Novas sombras deixando à nossa frente,
Aparece uma estrela que, fulgindo

No âmago da alma de quem sente,
Com amor vai as trevas diluindo
Até que o sol sorria novamente.



Renato Macedo

domingo, abril 01, 2007

Pecdshs - Dia 1 d'Abril



Neste dia das mentiras
Em que todos se tentam enganar
Com nada do que dizem te admiras
A desconfiança a tentar decifrar.
No meio de tanta treta
Há um fundo de verdade
O célebre dia da peta
É todos os dias uma realidade.
Este dia que há muito existe
Para se dizerem todas as falsidades
Mais um da mentira que persiste
Ou instituir o dia das verdades.
Neste país de enganos e teimosia
Prevalece a inveja e estupidez
A mentira neste “santo” dia
É um incentivo à safardez.



Pecdshs

Cintia Barreto - Fale Mentiras



Foto: Torsten Brandt



Desarme suas queixas.
Seja forte!
Sufoque os medos
adjacentes.
Revele a mentira
verossímil
dos pensamentos
mórbidos.

Experimente o gosto
do seu gozo!
Sinta a carne trêmula
sob seu nervo teso.
Mostre seu sorriso
agridoce que saliva
veneno e fale...
Fale mentiras!!!

Preciso ouvir suas
verdadeiras mentiras...
para desvendar...
seu gosto.



Cintia Barreto (Poetisa Brasileira)