Natália Correia - Marcelo e as Tágides
A propósito das eleições municipal que decorrem hoje em Lisboa, e que parecem parar o país, como se Lisboa fosse Portugal inteiro, recordo aqui as palavras de Natália sobre um Marcelo, certa vez candidato a presidente da Câmara Municipal de Lisboa.
Marcelo, em cupidez municipal
de coroar-se com louros alfacinhas,
atira-se valoroso - ó bacanal!
- ao leito húmido das Tágides daninhas.
Para conquistar as Musas de Camões
lança a este, Marcelo, um desafio:
jogou-se ao verso o épico? Ilusões!...
Bate-o o Marcelo que se joga ao rio.
E em eleitorais estrofes destemidas,
do autárquico sonho, o nadador
diz que curara as ninfas poluídas
com o milagre do seu corpo em flor.
Outros prodígios - dizem - congemina:
ir aos bairros da lata e ali, sem medo,
dormir para os limpar da vil vérmina
e triunfal ficar cheio de pulguedo.
Por fim, rumo ao céu, novo Gusmão
de asa delta a fazer de passarola
sobrevoa Lisboa o passarão
e perde a pena que é da galinhola.
In Cancioneiro Joco-Marcelino, publicado n'O Corvo, jornal de campanha eleitoral autárquica da Coligação por Lisboa. Nov/Dez de 1989.
Natália Correia (Poetisa portuguesa, 1923-1993)
Sem comentários:
Enviar um comentário