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segunda-feira, julho 07, 2008

Vitor Hugo - Desejo-te



Desejo primeiro que ames,
E que amando, também sejas amado.
E que se não fores, sejas breve em esquecer.
E que esquecendo, não guardes mágoa.
Desejo, pois, que não sejas assim,
Mas se fores, saibas ser sem desesperar.
Desejo também que tenhas amigos,
Que mesmo maus e inconsequentes,
Sejam corajosos e fiéis,
E que pelo menos num deles
Possas confiar sem duvidar.
E porque a vida é assim,
Desejo ainda que tenhas inimigos.
Nem muitos, nem poucos,
Mas na medida exacta para que, algumas vezes,
Te interpeles a respeito
Das tuas próprias certezas.
E que, entre eles, haja pelo menos um que seja justo,
Para que não te sintas demasiado seguro.
Desejo depois que sejas útil,Mas não insubstituível.
E que nos maus momentos,
Quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para te manteres de pé.
Desejo ainda que sejas tolerante,
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Sirvas de exemplo aos outros.
Desejo que, sendo jovem,
Não amadureças depressa demais,
E que sendo maduro, não insistas em rejuvenescer
E que sendo velho, não te dediques ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.
Desejo também que sejas triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubras
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que descubras,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes e que estão à tua volta.
Desejo ainda que afagues um gato,
Alimentes um cuco e ouças o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, te sentirás bem por nada.
Desejo também que plantes uma semente,
Por mais minúscula que seja,
E acompanhes o seu crescimento,
Para que saibas de quantas
Muitas vidas é feita uma árvore.
Desejo, outrossim, que tenhas dinheiro,
Porque é preciso ser prático.
E que pelo menos uma vez por ano
Coloques um pouco dele
Na tua frente e digas «Isso é meu!»,
Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.
Desejo também que nenhum dos teus afectos morra,
Por ele e por ti,
Mas que se morrer, possas chorar
Sem te lamentares e sofrer sem te culpares.
Desejo por fim que, sendo homem,
Tenhas uma boa mulher,
E que sendo mulher,
Tenhas um bom homem
E que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,
E quando estiverem exaustos e sorridentes,
Ainda haja amor para recomeçar.
E se tudo isso acontecer,
Não tenho mais nada a desejar-te.



Vitor Hugo (Poeta e escritor francês, 1802-1885)

sexta-feira, junho 06, 2008

Sara Silva - A minha vida é uma odisseia



A minha vida é uma odisseia, uma cruzada
Na busca da essência perfeita,
Do beijo avassalador, do brilho vibrante,
Do coração de propulsão extrema,
Da alma gémea também ela incompleta.

Procurei entre amigos e conhecidos
Numa busca sem fim nem sentido.
Sonhei com o dia em que nos encontrávamos
E juras de amor trocávamos.
Cansei-me de falar de ti ao mar,
De contar ao sol como te amo
E de pedir ás estrelas conforto
Por não te ter a meu lado.

Não te conheço, mas sei que um dia
O destino te trará até mim.
E só nesse momento poderei dizer
A palavra: AMO-TE!!!!



Sara Silva (Poetisa portuguesa, 1990- )

terça-feira, dezembro 25, 2007

Teresa Balté - cerras a garganta para que a paixão não suba



cerras a garganta para que a paixão não suba
à língua amarga ausente a outra boca
disciplinas o peito para que o amor não flua
em flores e em orvalhos e não se reproduza

cristalizas a fome envelheces à míngua
a vida não regressa o juro é ouro é ferida
o acúleo na rosa o golpe de alegria
a vida é a/ventura não aprendeste ainda?




Teresa Balté (Poetisa Portuguesa, 1942- )

domingo, outubro 14, 2007

Regina Derieva - A poem



A poem—
is just one more
scrap of paper
that has sailed off the table
in a bottle
with a cry for help.




Regina Derieva (poeta Russa, 1949- )

Biografia de Regina Derieva

Regina Derieva - All my life



All my life
I sought
an angel.
And he appeared
in order to say:
"I am no angel !"




Regina Derieva (Poeta Russa, 1949- )

Biografia de Regina Derieva

segunda-feira, outubro 01, 2007

Ibrahim Nasrallah - Desconcertado



Al principio
Los caballos dijeron, nosotros necesitamos las planicies
Las águilas dijeron, nosotras necesitamos las cimas
Las serpientes dijeron, nosotras necesitamos las madrigueras
Mas los humanos permanecían desconcertados.




Ibrahim Nasrallah (Poeta da Jordânia, 1954- )

Traducciones de Raúl Jaime Gaviria

Biografia de Ibrahim Nasrallah

domingo, setembro 23, 2007

Pedro Shimose - A Vida está a matar-me



Já não me persegue o terror político
com seu raio laser,
nem os próximos me amam
com seus cassetetes e serras eléctricas.
Já não me ofende a Declaração Universal
dos Direitos Humanos
nem a bomba me tira o sono
nem sequer uma guerrinha na África ou na Europa.
O que mais acontece?
Caem os muros,
crescem os lamentos
o ódio volta
com seus anjos violentos.
O Sul segue para onde sempre esteve
Não nos portamos mal
(é evidente)
e todos estão contentes,
constitucionalmente.
Esta vida me excede
com sua nicotina,
seu enfarte e cancro,
com o medo da Sida e das seringas.
Só o amor e a poesia
podem ser meus
quando a ninguém parece importar
o amor
e
a poesia.




Pedro Shimose (Poeta, escritor e jornalista Boliviano, 1940- )

Biografia de Pedro Shimose

Tradução Sílvio Persivo, com a adaptações para o português de Portugal realizadas por Susana B.




La Vida Me Está Matando



Ya no me persigue el terror político
con su rayo láser,
ni los prójimos me aman
con su palo y su picana eléctrica.
Ya no me ofende la Declaración Universal
de los Derechos Humanos,
ni la bomba me quita el sueño,
ni siquiera los disparos
de una guerrita en Africa o Europa,
¡qué más da!
Caen los muros,
crecen los lamentos.
Y el odio vuelve
con sus ángeles violentos.
El Sur sigue donde estaba.
No nos portamos mal
(es evidente)
y todos tan contentos,
constitucionalmente.
Esta vida me sobra
con su nicotina,
con su infarto y su cáncer,
con su miedo al sida y las jeringas.
Sólo el amor
y la poesía
pueden ser míos
cuando a nadie parece ya importarle
el amor
y
la poesía.




Pedro Shimose (Poeta, escritor e jornalista Boliviano, 1940- )

domingo, agosto 19, 2007

Etheridge Knight - A poem to myself (or Blues for a Mississippi Black Boy)



Foto: Ol' Man River, de JucaFii



I was born in Mississippi;
I walked barefooted thru the mud.
Born black in Mississippi,
Walked barefooted thru the mud.
But, when I reached the age of twelve
I left that place for good.
My daddy chopped cotton
And he drank his liquor straight.
Said my daddy chopped cotton
And he drank his liquor straight.
When I left that Sunday morning
He was leaning on the barnyard gate.
Left my mama standing
With the sun shining in her eyes.
Left her standing in the yard
With the sun shining in her eyes.
And I headed North
As straight as the Wild Goose Flies,
I been to Detroit & Chicago
Been to New York city too.
I been to Detroit & Chicago
Been to New York city too.
Said I done strolled all those funky avenues
I'm still the same old black boy with the same old blues.
Going back to Mississippi
This time to stay for good
Going back to Mississippi
This time to stay for good-
Gonna be free in Mississippi
Or dead in the Mississippi mud.




Etheridge Knight (Poeta Norte-Americano, 1931-1991)

Biografia de Etheridge Knight

domingo, agosto 05, 2007

Kalungano - Sonho de Mãe negra



Foto: Mãe Cacau, Luís Lobo Henriques



Mãe negra
Embala o seu filho
E na sua cabeça negra
Coberta de cabelos negros
Ela guarda sonhos maravilhosos

Mãe negra
Embala o seu filho
E esquece
Que o milho já a terra secou
Que o amendoim ontem acabou

Ela sonha mundos maravilhosos
Onde o seu filho iria á escola
Á escola onde estudam os homens

Mãe negra
Embala o seu filho
E esquece
Os seus irmãos construindo vilas e cidades
Cimentando-as com o seu sangue

Ela sonha mundos maravilhosos
Onde o seu filho correria na estrada
Na estrada onde passam os homens

Mãe negra
Embala o seu filho
E escutando
A voz que vem de longe
Trazida pelos ventos
Ela sonha mundos maravilhosos
Mundos maravilhosos
Onde o seu filho poderá viver.



Kalungano (Pseudónimo de Marcelino dos Santos, poeta moçambicano)

domingo, julho 22, 2007

Natália Correia - Nuvens correndo num rio



Nuvens correndo num rio
Quem sabe onde vão parar?
Fantasma do meu navio
Não corras, vai devagar!

Vais por caminhos de bruma
Que são caminhos de olvido.
Não queiras, ó meu navio,
Ser um navio perdido.

Sonhos içados ao vento
Querem estrelas varejar!
Velas do meu pensamento
Aonde me quereis levar?

Não corras, ó meu navio
Navega mais devagar,
Que nuvens correndo em rio,
Quem sabe onde vão parar?

Que este destino em que venho
É uma troça tão triste;
Um navio que não tenho
Num rio que não existe.



Natália Correia (Poetisa portuguesa, 1923-1993)

domingo, julho 08, 2007

Antero de Quental - Despondency



Deixá-la ir, a ave, a quem roubaram
Ninho e filhos e tudo, sem piedade…
Que a leve o ar sem fim da soledade
Onde as asas partidas a levaram…

Deixá-la ir a vela, que arrojaram
Os tufões pelo mar, na escuridade,
Quando a noite surgiu da imensidade,
Quando os ventos do Sul se levantaram…

Deixá-la ir, a alma lastimosa,
Que perdeu fé e paz e confiança,
À morte queda, à morte silenciosa…

Deixá-la ir, a nota desprendida
Dum canto extremo… e a última esperança…
E a vida… e o amor… deixá-la ir, a vida!



Antero de Quental (Poeta português. Ponta Delgada, 1842-1891)

domingo, junho 03, 2007

Silva Tavares - Fado de cada um



Bem pensado
Todos temos nosso fado
E quem nasce mal fadado melhor fado não terá
Fado é sorte
E do berço até à morte
Ninguém foge por mais forte
Ao destino que Deus dá

No meu fado amargurado
A sina minha bem clara se revelou,
Pois cantando seja quem for adivinha na minha voz soluçando
que eu finjo ser quem não sou

Bem pensado
Todos temos nosso fado
E quem nasce mal fadado melhor fado não terá
Fado é sorte
E do berço até à morte
Ninguém foge por mais forte
Ao destino que Deus dá

Bom seria poder um dia trocar-te o fado
por outro fado qualquer
Mas agente já traz o fado marcado
E nenhum mais inclemente do que este de ser mulher

Bem pensado
Todos temos nosso fado
E quem nasce mal fadado melhor fado não terá
Fado é sorte
E do berço até à morte
Ninguém foge por mais forte
Ao destino que Deus dá



Silva Tavares (Poeta português)

Luís Vaz de Camões - Com que voz



Com que voz chorarei meu triste fado,
que em tão dura paixão me sepultou.
Que mor não seja a dor que me deixou
o tempo, de meu bem desenganado.

Mas chorar não estima neste estado
aonde suspirar nunca aproveitou.
Triste quero viver, pois se mudou
em tristeza a alegria do passado.

Assim a vida passo descontente,
ao som nesta prisão do grilhão duro
que lastima ao pé que a sofre e sente.

De tanto mal, a causa é amor puro,
devido a quem de mim tenho ausente,
por quem a vida e bens dele aventuro.



Luís de Camões (Poeta português, 1524 ou 1525 - 1579 ou 1580)

domingo, maio 20, 2007

Chico Buarque - Cotidiano



Foto: José Pinto Ribeiro



Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã

Todo dia ela diz que é pra eu me cuidar
E essas coisas que diz toda mulher
Diz que está me esperando pro jantar
E me beija com a boca de café

Todo dia eu só penso em poder parar
Meio dia eu só penso em dizer não
Depois penso na vida pra levar
E me calo com a boca de feijão

Seis da tarde como era de se esperar
Ela pega e me espera no portão
Diz que está muito louca pra beijar
E me beija com a boca de paixão

Toda noite ela diz pra eu não me afastar
Meia-noite ela jura eterno amor
E me aperta pra eu quase sufocar
E me morde com a boca de pavor

Todo dia ela faz tudo sempre igual
Me sacode às seis horas da manhã
Me sorri um sorriso pontual
E me beija com a boca de hortelã



Chico Buarque (Poeta, compositor, cantor brasileiro, 1944- )

domingo, abril 22, 2007

Renato Macedo - Ao cair da noite



Quando a noite vem caindo sobre a vida
E de sombras vestindo o pensamento,
Quimeras e volúpias vão morrendo
Em altar de carcaça ressequida.

Qual navio em manobras de partida,
Rumando ao mar em débil movimento,
Minha alma voa, presa ao firmamento,
Seguindo a juventude além perdida.

Corridas, revoadas sem destino
À procura do sonho e do enlevo,
Neste canto de cisne vespertino,

São lampejos da vida em desespero
Na pira dum amor em desatino,
Mirrando entre as cinzas do desterro.



Renato Macedo (Poeta português)

domingo, abril 08, 2007

Adolfo Casais Monteiro - Ato de Contrição




Pelo que não fiz, perdão!
Pelo tempo que vi, parado,
correr chamando por mim,
pelos enganos que talvez
poupando me empobreceram,
pelas esperanças que não tive
e os sonhos que somente
sonhando julguei viver,
pelos olhares amortalhados
na cinza de sóis que apaguei
com riscos de quem já sabe,
por todos os desvarios
que nem cheguei a conceber,
pelos risos, pelas lágrimas,
pelos beijos e mais coisas,
que sem dó de mim malogrei

— por tudo, vida, perdão!



Adolfo Casais Monteiro (Poeta português, 1908-1972)

Al Berto - Lázaro



é tempo de simulares a ressurreição
ergue-te da eternidade dos astros
escava nas veias três dias mortas
o sonho
e no fundo do espelho respira alegria
sobre o rosto escuro como um mingrólio
acende-te
na humidade sonolenta das mãos
finge a vida
mesmo que permaneça morto
bebe
a perene memória das imagens

levanta-te de mim Lázaro
como se fosses água ainda turva
sublima-te com o delicado fulgor da respiração
e não ao contínuo movimento falso
do coração




Al Berto (Poeta português, 1948-1997)

Jáder Carvalho - Eu me enganei



Foto: A minha grande ilusão, Rui Vale de Sousa.



Eu me enganei quando disse: "É o fim!"
Via-me no espelho: a neve no cabelo.
As rugas se cruzavam no meu rosto.
A vista se cansava. Ah, era o fim!

Dentro do peito, o coração batia.
Em contraste com o rosto, a alma era jovem.
Eu gostava do cheiro das mulheres:
ia do olfato às profundezas d’alma.

Pensei: "A vida não me chega ao termo.
Sou todo vida. Só por fora é a morte."
E o mundo viu minha ressurreição.

Ah, quantas noites dormirei contigo!
Ah, quanto sol-nascente inda me espera!
A estrada é longa, mas não cansarei!...



Jáder Carvalho (Jornalista, poeta, romancista, ensaísta, professor e advogado brasileiro, 1902-1985)

domingo, abril 01, 2007

Carlos Drummond de Andrade - Não Passou



Passou?
Minúsculas eternidades
deglutidas por mínimos relógios
ressoam na mente cavernosa.

Não, ninguém morreu, ninguém foi infeliz.
A mão- a tua mão, nossas mãos-
rugosas, têm o antigo calor
de quando éramos vivos. Éramos?

Hoje somos mais vivos do que nunca.
Mentira, estarmos sós.
Nada, que eu sinta, passa realmente.
É tudo ilusão de ter passado.



Carlos Drummond de Andrade (Poeta Brasileiro, 1902-1987)

António Maga - Cactos



Foto: Flight in Dream, de Yuri Bonder


o meu corpo recusa-se a viver.
este corpo só brinca.
brinca à vidinha
patética
das recusas sorridentes.
brinca às
brincadeiras tristes
de corpos
entrelaçados,
de gemidos
simulados.

este corpo
só brinca
às palavras vendidas
de mentiras
de mentiras
de mentiras.

este corpo
só brinca à vidinha
de ninfeta
no deserto:
o clítoris em chama
e à volta só há cactos.



António Maga